Caçadores Caçados

por galinskas em

Uma pintora. Vampiros. Londres. Uma nova crônica de Storytelling.

O luar que atravessava a janela aberta fazia luzir a pele exposta da pintora. Escolhera a lingerie branca para aquele trabalho, pois queria se sentir suja de tinta naquela noite. A tensão exercida pela cinta-liga era inspiradora.

Observava a tela, ainda vazia, enquanto mordia de leve as cerdas do pincel, já com tinta. Tinha o gosto refrescante da noite.

Sem demoras, deitou-se de costas no chão e levou a bisnaga metálica à pelve, causando uma reação em cadeia no corpo. Os pelos eriçaram quando a tampinha de plástico fez contato íntimo, e leves convulsões fizeram a mulher serpentear pelo chão do amplo estúdio durante alguns minutos. Quando se deu por satisfeita, desrosqueou a tampa e simulou uma ejaculação de tinta branca sobre o tronco nu.

Rapidamente levantou-se e abraçou o quadro, fazendo a tinta espalhar aleatoriamente. Depois se afastou e observou a forma resultante, distinguível pelo brilho da tinta molhada. Um cão. Mas não qualquer cão; era Ringo, o vira-latas de estimação que tivera na infância. Lá estava ele pulando em toda a glória de sua juventude.

Antes que a inspiração desaparecesse, moveu rapidamente o pincel pela tela, com tanta força que chorou. A Sala Escondida surgia novamente pelos seus traços, tão viva e nítida como lembrava. Lírios no papel de parede. Lâminas coladas com sangue no teto. E Ringo pulando no primeiro plano, iluminado pela única e incansável lâmpada incandescente na luminária cheia de insetos mortos.

 - Está muito bom, Krista. Os lírios são exatamente como me lembro, e você os faz perfeitamente a cada vez – diz um homem saindo das sombras. Aparentemente estivera ali o tempo todo.

- Vai mexer em alguma coisa?

O homem pegou o pincel e analisou a obra de perto. Krista agarrou-o pela perna como se estivesse muito agradecida por alguma coisa.

- Não. Está ótimo assim, como sempre. Qual o título?

- Um Cão na Sala Escondida – disse a mulher, ao que o homem respondeu com um som afirmativo.

 Finalmente a marca da artista, um duplo “K”, foi feita no canto da tela com a prática conquistada depois de centenas de assinaturas.

“Krista King”

Mas aquela não era Krista.