Dicas práticas para narrar Vampiro: o Réquiem

por volmer em

Existem certas facilidades e truques para se conduzir um bom jogo de Vampiro: o Réquiem que os livros não abordam. São coisas que só várias tentativas de crônicas e muitas sessões de jogo podem ensinar.

No fórum do RPG.net o usuário Shawn compartilhou alguns desses segredos, muito interessantes e que podem ser bastante úteis caso você esteja começando ou se as suas sessões não estejam vingando como esperado. Trago até vocês uma versão traduzida, com permissão do autor. A proposta aqui não é definir "o jeito certo" de narrar Vampiro, até porque essas sete dicas podem funcionar para alguns jogos e ser inviável para outros, mas sim dar conselhos práticos que podem ser muito bem aproveitados na organização das suas crônicas. Confira! 

 

1 - Dê aos personagens dos jogadores o mesmo domínio

Uma crônica de Vampiro muitas vezes corre o risco de se transformar em um jogo solo para cada persongem, com cada um correndo atrás de seus compromissos com seus próprios clãs e coalizões. É muito mais fácil manter uma coterie unida e focada se todos compartilharem o mesmo domínio. Primeiro, porque eles irão caçar e viver na mesma área, daí você maximiza as oportunidades deles se alimentarem e andarem juntos. Segundo, porque se você tem algo que ameaça o domínio (como um membro da família rival, uma gangue de rua mortal, um determinado policial, caçadores de vampiros, uma determinada enfermidade, monstros esquisitos, etc) será um problema de todos.

No meu jogo atual os personagens dos jogadores são os responsáveis pelo bairro de Hell's Kitchen, Manhattan. Esse compartilhamento de território, além dos benefícios que descrevi, me permitiu centrar em uma pesquisa sobre o bairro e encontrar todo tipo de detalhe bacana no Google Maps e afins. É claro que eu posso apenas criar e improvisar (e eu faço), mas pelo simples fato de saber que existe um museu de aviação, uma igreja católica croata e o principal terminal rodoviário de Nova York no território dos personagens já me oferece ganchos para todo tipo de história. 

 

2 - Uma estrutura política concisa e bem amarrada é amiga do narrador

Até que é mencionado no livro básico do Réquiem, mas eu não havia me tocado da importância da política de Vampiro até ler Damnation City. Tome um tempo para dividir sua cidade entre o Príncipe, regentes, vassalos e servos (eu adicionei um outro nível à cidade acrescentando duques, que são basicamente regentes de regentes, já que minha cidade é grande o bastante para precisar deles). A não ser que os personagens dos jogadores estejam totalmente desligados da estrutura do poder eles precisarão se reportar a alguém, que também se reportará a outra pessoa até chegar ao Príncipe. Se você os fizer todos vassalos do mesmo domínio como eu fiz, significa que eles terão um único regente sobre eles e colegas vassalos que serão amigáveis ou não, além de outros regentes que detestam o deles. Até a simples necessidade de um lugar para dormir ou de mortais para se alimentar pode levar a todo tipo de envolvimento com a política vampírica, o que proporciona um enredo e conflitos para o seu jogo.

Acredito que o sistema político é a maior diferença entre a Máscara e o Réquiem. Aparentemente as coisas são bem similares nos dois, mas em jogo dá pra perceber que são politicamente muito distintos. A organização neofeudal proposta pelo Réquiem, com a cidade toda segmentada, torna ainda mais evidente toda a brutalidade da sociedade dos amaldiçoados. 

 

3 - Ambiente o jogo em uma grande cidade

Antigamente eu sempre conduzia Vampiro em cidades de médio porte: Nova Orleans, St Louis, Boston, São Francisco, Austin, etc. Mesmo com o Réquiem dobrando o número de vampiros numa cidade em comparação com a Máscara, a população dos amaldiçoados nesse acabava ficando entre 20 e 40 membros da Família.

Hoje meu jogo se passa em Nova York, que tem uma população superior a 200 vampiros. Isso quer dizer que se eu preciso de um bando de gangrels punk rock ou uma dezena de nosferatus cegos albinos vivendo debaixo da cidade posso fazê-los surgir sem medo de distorcer a população local (sim, é meio idiota ter que se preocupar com a população fictícia de vampiros em uma cidade, mas o encanto do jogo pode ser quebrado por coisas ainda mais estranhas). Também significa que minha cidade é grande o bastante para ter amaldiçoados perto de qualquer coisa ou lugar. Essa foi uma mudança tão positiva que eu não penso em voltar atrás por tão cedo. 

 

4 - Por tudo o que é mais sagrado, não detalhe todos os habitantes!

Eis mais uma vantagem de se ter 200 ou mais vampiros em vez de 20: eu não preciso saber quem todo mundo é! Hoje, após poucos meses de crônica, já introduzi uma tonelada de NPCs, mas ainda nem faço idéia de quem são todos os membros da Ordo Dracul da cidade, todos os Sangiovanni ou todos os membros da família que moram no Harlem, no Bronx ou na Staten Island. Simplesmente porque eu não preciso saber. Enquanto o jogo prossegue, ter um monte de NPCs não detalhados me permite criá-los e adicioná-los assim que eles precisam aparecer. Se eu decido que a próxima história deverá girar em torno da Ordo Dracul, então é hora de criar alguns dragões, ou se os personagens dos jogadores partem para o bairro de Astoria, eu posso criar os vassalos locais e definir seus atributos mais tarde.

Ter NPCs desconhecidos traz ainda outros benefícios. Em jogos situados em cidades menores enfrentei o problema de ter que focar os históricos dos NPCs uns contra os outros em vez de centrar esses conflitos nos personagens dos jogadores. Mas de forma alguma vou perder meu tempo hoje me preocupando com as disputas territorias no Queens, por exemplo, afinal, eu nem conheço quem são os vampirs de lá (mas conheço um casal do Queens, pois eles já deram as caras em uma sessão e se tornaram importantes).

Como consequência dessa dica, não tenha medo de dizer "eu não sei" caso os jogadores perguntem sobre detalhes que você ainda não definiu. Se for realmente importante, improvise: "você reconhece que esse grafite marca esse território como pertencente a um Língua de Cobra - uma entidade particularmente maligna. Você deveria fugir para um lugar público o mais rápido possível". Se algum jogador perguntar "mas então, quem é o responsável pelo local X do outro lado da cidade?", não tenha medo de dizer "eu não criei ainda". Depois, é claro, construa algo para a próxima sessão. 

 

5 - Arrume uns mapas

Fiz um acordo com meus jogadores. Combinei com eles após a primeira sessão de jogo que caso eles conseguissem uns mapas de Nova York eu daria um ponto extra de XP. Um dos jogadores acabou comprando alguns mapas bem legais (um do estado inteiro, outro menor de Manhattan e um mapa das rotas do metrô) e o grupo pagou pra ele uma parte. Daí vou demarcando nos mapas cada um dos domínios assim que os jogadores tomam conhecimento deles. Detalhamos o domínio dos seus personagens, do seu Regente e dos demais regentes de Manhattan. Para cada detalhe que surge no jogo mais informações são adicionadas no mapa.

Também é divertido vê-los desvendar e desenvolver toda uma logística para percorrer a cidade. O metrô é um domínio aberto e alguns membros da Família permitem a outros passarem ou até caçarem em seus territórios, mas alguns vampiros são muito protecionistas, e nesses casos os jogadores precisam bolar seus caminhos de modo a evitar esses domínios.

Desde que dei aos jogadores seus próprios domínios permiti a eles bolarem suas próprias leis locais. Eles estabeleceram que nenhum outro vampiro pode entrar no Hell's Kitchen sem permissão e ninguém mais pode caçar lá. Dois personagens mais inumanos desenvolveram um até serviço de remoção de corpos, e permite que outros amaldiçoados entrem nos limites do Hell's Kitchen para despejar cadáveres em depósitos especialmente marcados.

Não sou fã de ambientar jogos do Mundo das Trevas em cidades fictícias - particularmente nunca vi uma cidade assim que fosse interessante ou que evocasse bem o tom de uma cidade moderna do mundo real. Mas se você decidir partir para uma cidade fictícia em vez de Nova York, Los Angeles, Cidade do México ou qualquer outra, separe um tempo para criar um mapa decente do lugar. Você não precisa conhecer cada rua, mas deve estar por dentro de todos os bairros e áreas importantes. 

 

6 - Situe o jogo no passado

Descobri essa por acidente, quando fiquei tão entretido com o New Wave Requiem que decidi situar um jogo meu nos anos 80. Recomendo expressamente começar qualquer crônica de Vampiro antes de 2010. Os personagens dos seus jogadores vão viver pra sempre, e muito da diversão de Vampiro está em ver os personagens e o mundo mudar com o tempo - mesmo que esse tempo seja apenas 27 anos. Comece seu jogo em algum período em que você se sinta confortável - pode ser nos anos de 1700 ou por volta de 1990, apenas um intervalo que dê ao jogo um espaço para respirar. Mesmo que você não prossiga a crônica até os dias atuais, essa simples possibilidade já acrescenta muito ao jogo. Os jogadores sabem que talvez seus personagems vivam o bastante para serem os manda-chuvas quando o jogo atingir o presente, e você ainda conta com os fatos históricos como guias para criar boas histórias e perigos no seu jogo.

Por exemplo, se minha crônica rola em 1983, a criminalidade do Hell's Kitchen dos anos 80 (e de Nova York no geral) historicamente vai dar lugar à gentrificação, à revitalização e à prosperidade. Assim, os gângsters irlandeses locais serão inevitavelmente capturados pela lei RICO e haverá uma limpeza geral do Hell's Kitchen, tornando-o um bairro moderno e seguro com o passar dos anos. Essa é uma coisa boa para a maioria das pessoas, mas poderá ser um grande incômodo para alguns personagens. Será interessante ver como eles reagirão a isso ao longo do tempo.

Contar com a vantagem do tempo também permite a você brincar e causar grandes mudanças na face da poítica vampírica local, deixando-a completamente caótica e instável. O Moviento Cartiano eventualmente derrubará o Invictus? Os segredos macabros do Círculo da Anciã serão finalmente revelados? Sem falar que a morte do Príncipe de Paris terá consequências muito maiores se ocorrer após 20 anos do que após 2 meses. 

 

7 - Humanos, yo!

Uma das vantagens de dar aos personagens um território menor de uma grande cidade é que os habitantes mortais dos seus domínios terão mais importância. As pessas no seu bairro não são apenas uma fonte de sangue, elas são uma fonte de poder, inimigos, amantes, ameaças e histórias.

Nesse meu jogo, a máfia irlandesa e as gangues porto-riquenhas se tornaram quase tão importantes quanto os vampiros da cidade. O fato dos personagens dos jogadores serem os únicos membros da Família em seus domínios possibilitam histórias onde eles, na pretensão de influenciar ou controlar simples e frágeis humanos, acabem tendo que lidar com conflitos maiores. Uma gangue de mafiosos irlandeses pode não ter super poderes, mas tem espingardas e explosivos, e lidar com eles pode gerar problemas com a Máscara.

Uma das melhores coisas do novo Mundo das Trevas é o seu foco nos seres humanos, exigindo dos vampiros a conciliação das necessidades de A - Se alimentar de gente - e de B - tentar manter um semblante de humanidade para que mantenham uma certa sanidade e possam caçar humanos mais facilmante. Você pode ter boas histórias quando nenhum dos antagonistas tem poderes ou formas sobrenaturais, a oposto dos personagens dos jogadores.

 

Acho que isso é tudo que tenho em mente. Curtiu? E você, quais truques aprendeu para deixar o Réquiem um jogo super legal?

 

Post original: http://forum.rpg.net/showthread.php?t=535823