Sob uma Lua de Sangue - Capítulo 5
Ela estava sentada lá faziam agora três horas. Já havia perdido a conta de quanto tempo passava sem dormir e já não fazia mais diferença. Nada mais fazia diferença.
Alyne Sullivam estava agora sentindo o seu mundo desmoronar. Era como ver tudo em câmera lenta. Até mesmo o relógio parecia se recusar a andar enquanto ela tentava organizar os pensamentos na sua cabeça. Respirou fundo, sentindo o aroma do café que agora esfriava na impecável mesa branca da sala do diretor Cooper e tentou, mais uma vez, entender tudo que estava acontecendo.
Há mais ou menos duas semanas, o diretor havia dado a ela uma amostra de tecido e ordens para ela descobrir qualquer traço de vírus ou bactérias contidos nele. Fora da sua vida no CCD, ela havia comprado uma casa nova e estava bastante satisfeita consigo mesma e com as melhoras que havia conquistado em sua vida.
Agora, bastaram três horas para ela descobrir que um vírus mortal e sem cura está se espalhando pela cidade, todos os seus amigos, parentes e conhecidos estão correndo perigo, um diretor do CCD foi morto em sua própria sala e outro havia desaparecido sem deixar rastros. Isso sem contar o fato de que o diretor-chefe da equipe de Virologia havia passado as últimas duas horas repetindo a mesma história três vezes na sua frente, enquanto ela fazia esforço para entender como havia ido parar no meio dessa confusão toda.
“Lyn...”
É claro que poderia ter continuado na faculdade de medicina e estar agora tomando café em seu próprio consultório enquanto a elite da cidade dava pilhas de dinheiro por uma simples consulta. Mas não. Ela havia largado a faculdade de medicina para cursar biomedicina, na esperança de que fosse contratada para o CCD. É claro que na época ela tinha uma visão romantizada da coisa toda e os primeiros meses no Centro de Controle de Doenças haviam sido algo bem diferente dos seus sonhos. Mas agora não tinha mais do que reclamar. Pelo menos não até hoje.
“Alyne, você entendeu tudo que eu te falei?”
“Desculpa, Cooper, eu só estou um pouco... confusa.”
“Não sei como posso tornar as coisas mais claras para você, Alyne, mas tudo que eu falei é verdade.”
“Mas por que você está me contando isso tudo, Cooper? Quero dizer.. Você não deveria estar comunicando à Divisão de Homicídios sobre a morte de Trevisan, entrando em contado com o Serviço Secreto para encontrar Roarke ou fazendo algo mais importante que passar a manhã inteira na sua sala me explicando tudo isso?”
William Cooper respirou fundo. Ele havia passado as últimas três horas explicando suas suspeitas quanto a Roarke e seu receio em chamar os federais para remover o corpo de Trevisan, pois, uma vez que eles soubessem de tudo, seria quase impossível evitar que a impressa divulgasse a coisa toda e as começasse a mostrar hipóteses insanas sobre o vírus na televisão.
“Alyne, eu já expliquei milhões de vezes que eu não posso-” – Ele foi interrompido.
“... que não pode explicar aos federais tudo sem antes ter uma explicação plausível para tudo isso que está acontecendo. Certo. Mas a pergunta é: Por que eu, Cooper? Por que me escolheu para contar tudo isso ao invés de simplesmente seguir em frente com suas investigações?”
“Confio em você, Alyne. A Divisão de Doenças de Alto Contágio só tem três cientistas-chefes e todos são os diretores do CCD, ou seja, atualmente apenas eu posso tomar qualquer decisão aqui dentro sem ser questionado A partir do momento em que eu comunicar a perda de um simples fio de cabelo à Polícia, todos os funcionários serão postos sob supervisão e a vida de cada um de vocês será revirada de cabeça para baixo até que se encontre um suspeito. Você não quer que isso aconteça, quer? Eu preciso de ajuda, Alyne, e sei que posso conseguir mais respostas trabalhando com uma cientista que eu confio do que com algum agente ou especialista em biosegurança da Polícia Federal.”
“Cooper! Eu sou apenas uma uma cientista iniciante, não lidero nem mesmo uma equipe aqui dentro! Com certeza você tem profissionais mais capacitados do que eu!”
“Isso, minha querida, é apenas devido a um contratempo. Lyn, eu estou de olho em você desde o começo. Você me entrega os resultados no menor tempo possível e devolveu todas as amostras com os melhores relatórios que eu já vi. Além disso, você teve uma vida acadêmica brilhante, com notas altas o suficiente para passar para qualquer órgão público! Não se subestime, você é uma das nossas melhores assistentes e eu vejo um grande futuro para você.”
Ela nunca soube lidar com elogios profissionais e a essa altura era quase impossível esconder um sorriso orgulhoso que havia se formado em seu rosto.
“Cooper, eu...”
“Então... Posso contar com a sua ajuda, Lyn?”
“Afinal, o que eu tenho a perder?” Pensou Lyn. Não era como se tudo que Cooper falou fosse mentira. Sua carreira estava sendo um sucesso e sua vida acadêmica havia sido brilhante. Ela havia passado os últimos dois anos ajudando pessoalmente os cientista-chefes e o diretor Cooper, então eles deviam, de fato, ver algum futuro nela. E talvez se fosse bem-sucedida agora, bem, com um diretor morto eles precisarão promover algum cientista-chefe à diretor quando essa confusão acabar! O que significa que talvez ela pudesse até mesmo terminar isso como cientista-chefe! Sentiu novamente um sorriso se formando em seu rosto...
“É só me dizer o que eu preciso fazer.”
“Excelente!”
Cooper se levantou e foi até a mesinha que ocupava o centro da sua sala. Apertou uma sequência no teclado númerico do computador e a gaveta se abriu. Lá dentro havia apenas uma pasta roxa, que ele pegou e entregou para Lyn.
“Esses são os relatórios das últimas pesquisas sobre o vírus. Eu mesmo escrevi e revisei tudo, não creio que você terá dificuldades em entender nada. Leia tudo, tire um dia de folga e volte depois de amanhã para conversarmos sobre os acontecimentos. Alguma dúvida?”
“Não, não” Ela respirou fundo. “Eu vou indo então, Cooper, eu realmente preciso dormir.”
“Cuide-se, querida. Eu estarei no laboratório pelos próximos dias.”
Lyn já estava na porta quando se virou e chamou o cientista.
“Cooper. O que vai acontecer caso... caso o vírus seja liberado?”
O cientista respirou fundo e passou alguns segundos calado antes de tornar a falar.
“Isso, minha querida. Só Deus poderá nos dizer.”
Ela deu as costas e saiu da sala do cientista envolta em seus próprios pensamentos. Por que Trevisan havia sido assassinado? Aonde estava Roarke? Quem era o responsável pelo roubo das amostras do vírus? Ninguém seria maluco o suficiente para pedir resgate por um vírus. Ou seria? O pensamento de bioterrorismo causava arrepios na cientista. “Cooper está maluco. Ele devia comunicar às autoridades urgentemente. E se esse louco liberar o vírus?” Mas, se nem mesmo um diretor do CCD queria comunicar os acontecimentos à alguém, ela que não seria maluca de abrir a boca.
Era um segredo que estaria guardado muito bem entre os dois.