Prologo de Johann - Lembranças na Escuridão

por Nicolas_Salermo em

Ele anda pelas ruas com um objetivo em mente. Ele não se cansa de ser o mesmo objetivo de sempre. Na verdade, esse objetivo sempre foi o mais importante nos últimos dois anos. As lembranças que lhe atormentam todo o dia. Nenhuma outra lembrança é importante à não ser aquela que ele quer apagar.

Ele saiu de casa a pé e anda apressadamente pelas ruas e vielas da sua vizinhança. As luzes são fracas e frágeis, e a escuridão distorce seus sentidos, e o frio lhe retrai em seu longo casaco, mas isso nunca lhe importou ou mesmo intimidou.

A mansão em que vive não é mais a mesma desde a partida de sua esposa. Uma partida abrupta e forçada, mas necessária. Por mais que ele não quisesse, ele não poderia deixá-la continuar como estava. Suas alucinações laceravam em sua mente e de Johann também. Apesar de que depois de sua partida a mente de Johann parecia estar mais perturbada do que antes...

Flashs e mais flashs entorpeciam sua mente dia após dia. E mais um deles acabava de começar, como se fosse um flashback de um filme antigo.

 

“E pensar como ela era antes de casarem e como ficou após.

Ele lecionava antropologia na universidade de Oxford e ela... Era uma de suas alunas. Uma americana que havia se mudado para Europa para terminar a faculdade com boas grades de Antropologia. Claro que ele sabia as conseqüências de sua decisão, mas o que eles sentiam era mais forte. Ela o completava por inteiro.

Ele foi expulso da universidade por conta disso, mas ele não se importava. Nada mais importava. Ele a levou para viver com ele em sua mansão herdada por seu avô. Apesar de ter 30 anos na época, ele já era órfão. Sem vestígio algum de familiar ou algo do tipo.

Um ano após de se conhecerem já estavam decididos em se casar. E assim o fizeram. Um casamento somente entre eles dois. Johann não tinha família e estranhava que ela sempre mudasse de assunto ao falar de sua família nos EUA ou sobre seu passado, mas ela era uma pessoa distraída mesmo, não devia ser por mau.

Um ano após o casamento, A Notícia chegou!

O primeiro herdeiro da sua própria família chegaria. Estava muito feliz, pois finalmente teria uma família. Sua amada família.

Com a esperança da chegada de um novo ser, invés disso chegou o desespero, dor e angustia.

No sétimo mês de gestação, Alissa teve complicações de saúde e acabou pro perder o bebê. Ela ficou completamente transtornada. Johann acabou tendo que ignorar sua dor para cuidar da Alissa.

Cada mês que se passava ela piorava até um ponto em que os pesadelos se faziam presentes.

Em uma noite, Johann acordou de madrugada e ouviu algo estranho. Parecia uma música ao longe. Ao olhar para seu lado na cama, Alissa não estava lá. Então ele vagou na escuridão de sua mansão procurando de onde vinha tal música. A cada passo que dava a música se aproximava, e foi quando ele percebeu que era uma cantiga de ninar que vinha do futuro quarto do bebê.

Ao abrir a porta ele viu Alissa de costas, ao lado do berço do bebê. No quarto não havia muitas coisas, apenas o berço e o papel de parede de bichinhos que naquele dia já se encontrava rasgado.

Ela estava olhando carinhosamente para os braços cruzados e cantando uma canção de ninar:

 

- Shhh ! Senão vai acordar o bebê! – Alissa disse com um ar sereno e calmo ninando o vazio.

 

Naquela semana ela piorava cada vez mais, tentava dar comida para o ar, gritava para ele olhar o bebê que estava chorando, chorava falando que o bebê estava doente. Uma semana de desespero e Johann sabia que deveria fazer algo. Pesquisou sobre todas as clinicas psiquiátricas de Inglaterra. Até encontrar a escolhida. Naquela mesma semana a levou para clinica e a internou.

Mas mais uma vez o destino lhe havia reservado algo, pois no dia da internação de Alissa, o diretor lhe chamou em sua sala e uma notícia incabível foi dada.

O diretor disse que o nome dela estava nos registros do governo. Alissa fugira há 4 anos, era uma internada em estado grave, com problemas que só os piores medicamentos poderiam resolver. Ela variava entre um estado bom durante uns meses ou anos e depois piorava e ficava o dobro do tempo pior. Nunca sabiam quando viria à loucura ou quando ela estava adormecida.

Ele não teve outra escolha, a guarda dela estava com o governo, com o hospital de loucos, como ela chamava enquanto gritava e chorava para ele não deixar ela ali.”

 

Desde então, A vida de Johann caiu para sempre. Começou a beber e nunca mais parava. Não conhecia mais um motivo para viver. Passaram-se 2 anos e ele ainda não teve coragem de visita-la. Às vezes, de madrugada, escuta baixinho um choro vindo de algum lugar. Mas ele não se importa, a bebida faz este tipo de coisa... Assim como naquela noite.

Ele conhecia um bar que costumava ir. Ele sentava na bancada e se entorpecia quieto em seu canto.

Mas naquela noite a voz estava mais forte. A cada esquina que ele se aproximava, ele ouvia:

 

- Não beba! Não beba! Não beba! – Uma voz suave e destruidora dentro de sua mente.

 

A bebida causa essas coisas na gente, mas será com ela que irei me distanciar desse lugar que não há mais espaço pra mim.

Os passos se apressaram e avistou o pub do Gery na próxima esquina e hoje não ouviria mais pelo menos naquela noite a maldita voz em sua cabeça...