DRAGÕES - Capitulo 4 - Histórias na fogueira sob o luar

por LordIvel em

-Esse é guerreiro! Ele não pode lutar sozinho! - Disse a voz do além!

DAVID - Verde

LAUREL - Vermelho

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Eu já nem sei à quanto tempo estamos na estrada. dias. semanas. Só percorrendo a estrada. E Laurel afirma que minha alma está no fim dessa rodovia que, de vez em quando me dá impressão de não ter fim. Os dias são piores, tórridos intermináveis. Às vezes, vejo lampejos de carros e caminhões invisíveis para gente como eu, que escorreu pelas frestas. fantasmagóricos pertubadores.

Mas as noites são lá muito melhores. Afinal, nesse período tenho tempo para pensar. E, à noite, não dá para ver os veículos, somente seus faróis. Nessas horas, penso que talvez eu seja o fantasma. Que talvez aqui seja o inferno. Daí, eu continuo andando... pois até o inferno deve terminar em algum canto.

- Está ficando tarde, melhor descansar. Arranjar alguma coisa para comer.

- Alguma coisa para comer? Onde? - David olhou para todos os lados e via apenas terra, montanhas e arbustos que nem folhas haviam.

- por aqui!

- Por aqui? Por que viemos pra cá? Por que não fomos para lá? uma bússola marca mais de 359 graus, porque você escolheu vir... - Finalmente david avista uma cratera e lá em baixo tinha uma fogueira com 10 pessoas conversando e assando carne. - ...pra cá? Ninguém gosta de gente metida a besta.

- Nesse caso, sua vida deve ser terrivelmente solitária.

- Isso é da sua conta?

- Toda festa tem sempre um bicão. por isso te convidamos...

- Boa noite, pessoal. A gente estava... hã... percorrendo a estrada, rumo ao leste e a caminho de nova york. De repente avistamos essa fogueira, então...

- Podemos sentar?

- Claro.

- Valeu. Eu já ia chegar nessa parte.

- E quem tem tanto tempo assim? E aí, o que temos essa noite?

- O que deu para catar nesta área. A gente não se afasta demais do fogo. Longe das chamas é muito perigoso. Tem um monte de criatura por ai. De todo tipo. como sempre digo, antes encarar um demônio que a gente conhece do que um desconhecido... Bom, meu nome é Bob. Sou meio que o porta-voz deste grupo. Este é o Jefferson, aquela é a Sandy Lee, Miguel, Jorge, Cathi, Ed, Alexander, João e Carlos. E vocês, como se chamam? Só o primeiro nome, por favor, é tudo o que temos por aqui. Nunca diga seu sobrenome. Ele confere aos outros poder sobre você... - ele olhou para aquela carne assada e disse para si mesmo "Acho que é preciso uns dez minutos no fogo, tem partes ainda se mexendo!"

- Laurel.

- David.

- Oi Laurel e David. - Todos disseram sicronizadamente.

- Quer dizer que vocês estão à caminho de nova york?

- Pois é... Nós temos... Uns negócios a resolver lá e....

- A alma dele... - Laurel interrompe sua fala. - Foram tomadas pelos Dragões, e agente vai tentar um resgate... Apesar de ninguém jamais ter conseguido essa proeza. Isso aí é coelho?

Todos assustados olhavam com olhos arregala-dos para David, foi daí que um daquelas pessoas quebrou o silêncio...

- Há quanto tempo eles tomaram sua alma?

- Pouco mais de um mês.

- Nesse caso... é coelho, sim. Estamos a salvo. Ainda vai demorar para ele se transformar ou ter que ser abatido...

- Prefiro a morte!

- Aceita?

- Ah, imagina. Como eu disse, vai levar um tempo para isso ser necessário... Bem, onde a gente estava mesmo? Já lembrei. Cathi ia começar sua história. Toda noite alguém conta uma história, entende? Como a gente veio parar aqui, esse tipo de coisa. Pode falar Cathi...

HISTÓRIA DA CATHI:

"Tudo bem... como eu dizia, acho que acontecu logo depois que fiz 21 anos. Minha mãe... Ela sempre foi meio doente, entende? Frágil mesmo, pode-se dizer. Precisava de alguém para tomar conta dela. Durante nossa infância, mamãe era superprotetora, mantinha a gente dentro de casa, enquanto as outras crianças brincavam despreocupadas, arrumavam confusão e passavam gripes uma paras outras. Era realmente o melhor para nós... Principalmente quando meus dois irmão fugiram de casa, assim que alcançaram idade suficiente para isso...

A coitada sofreu um terrível abalo. Um terrível abalo... para nós duas.

A gente decidiu que talvez fosse melhor eu não cursar faculdade. Isso me deixaria muito tempo longe dela e, afinal de contas, mamãe precisava de alguém que cuidasse de sua saúde. Num certo inverno depois de um tombo feio, ela passava maior parte do tempo na cama. Eu dava comida na boca e ajudava a pobrezinha a caminhar até o banheiro e voltar. Lavava... Faxinava... Cuidava da casa... Não me sobrava tempo para futilidades. Eu tinha de estar sempre à disposição dia e noite. Não saía com ninguém nem sequer ia ao cinema. Sempre a disposição era o meu dever.

Não que eu jamais saísse de casa. Tinha de fazer compras, ir na lavanderia e retirar os livros que a mamãe queria na biblioteca. Eu jamais passei muito tempo na rua, pois isso me desconcentrava... Jim sempre me dizia: 'Está desperdiçando sua vida, Cathi. No colégio, você era tão... tão alegre e entusiasmada. Hoje, vive se sufocando naquela casa. Mas ainda tem escolha. Pode sair, construir a própria vida, é só tomar uma atitude...'

Jim não entendia ... Ninguém entendia ... Como poderiam ... Eles não ... Era tão ... Não havia saída ... e acho que ... ele gostava de mim.

Com o tempo, Jim parou de falar comigo. Depois, deixou de me enxergar. Eu podia até sair direto sem pagar as compras. Era como se eu estivesse mais lá. Como se a minha mãe fosse a única pessoa que ainda podia me ver. Até que, certo dia... Ela se foi!

Mamãe partiu. De repente e sem nenhum aviso, ela me deixou. E o que me restava? Depois de tanta dedicação, o que eu tinha afinal? Quem eu era? .... Quem eu era? .... Quem? .... ninguém... Eu era nada... Eu era invisível! E foi assim que eu vim parar aqui!"

FIM DA HISTÓRIA DA CATHI...

- Cacete!

- Miguel... acho que é sua vez!

HISTÓRIA DE MIGUEL:

"Eu já nasci no crime. Tipo, a gente não tinha muita escolha. Meu pai era da gangue... Ele, meu avô, meus tios e irmãos... é por isso que a gente passa por aquele batizado... É tipo sangue por sangue mesmo. Tu adota a vida e a gangue te adota, porque a gente não sabe que não tem mais saída. Eles eram meus manos, tão ligados? Ali, um cuida do outro, porque ninguém mais no mundo quer saber de cuidar. Claro que de vez em quando jorra sangue, mas faz parte! Cada gangue tem que proteger as crias. Toda semana o diretor do colégio pedia para falar com a orientadora...

ORIENTADORA - Eu simplesmente não sei mais o que fazer para te ajudar... você está jogando sua vida no lixo!

MIGUEL - A vida é minha. De que te importa?

ORIENTADORA - Pra mim importa, miguel. Eu já vi muitos jovens como você passarem por aqui e acabarem perdidos no mundo das drogas e gangues. Metade morreu antes dos 30, a outra está na cadeia. Quantos colegas de gangue você conhece, que ainda estejam vivos e em liberdade aos 40 anos?

MIGUEL - Sei lá... nunca fui tão bom em matemática, tá ligada?

Ela era gente fina. Sei que tava a fim de me ajudar, mas não tinha noção.

ORIENTADORA - Você sabe que isso não é verdade. Eu vi seus testes de Q.I., que te qualificam como brilhante. Sua capacidade de intelecção de textos supera a média, suas notas em matemática e ciências, também. Você pode se tornar alguém, não precisa se sujeitar a esse tipo de vida. Quer um exemplo? Tenho parentes em Nova Jersey. A cada inverno, todos reclamam das nevascas, das péssimas condições, do mercado de trabalho restrito. Sabe o que eu digo a eles? MUDEM-SE... Pronto e acabou. Quem não gosta de onde está, é só procurar algo melhor. Todo mundo tem escolhas, ninguém pode ficar no mesmo lugar. Cada qual precisa apenas se erguer, colocar um pé adiante do outro... e deixar para trás o que não presta. Mas eles querem me ouvir?? NÃO! Sempre arrumam alguma desculpa fajuta e continuam lá, na maior infelicidade do mundo. Tudo porque admitir que a escolha é deles implica tomar uma atitude, fazer alguma coisa a respeito ... ou assumir a própria incapacidade. è o que eles não conseguem encarar. Mas você encara, eu tenho certeza. Daqui a um mês, você vai se formar. Daí, terá que tomar algumas decisões. Sabe qual a maior delas? Você pode escolher não fazer parte de uma gangue, ainda que isso te obrigue a sofrer e se mudar para outra cidade! A escolha é toda sua... Por mais que você não queira reconhecer tal fato...

Dois ou três meses depois... nem lembro direito, os ganbés me fecharam com uns manos num carango roubado. Tipo, uns cinco minutos do desmanche. Vai dar azar assim na casa do capeta, né? Para piorar, eu tinha acabado de fazer 18 anos quando a casa caiu para mim, então fui julgado como adulto. Com os meus antecedentes acabei pegando bronca num presídio no interior do estado. Lá, eu logo me juntei aos manos latinos, o que garantiu minha segurança. Mesmo assim... PORRA!!! 18 para 19 anos era para ser a fase dourada, tão ligados? só baladas, trepadas e alopração geral. Tipo, aqueles deviam ser os melhores anos da minha vida! A cada dia, eu tentava me manter invisível. Tipo, só pensava em sair e retomar a vida, entende? Mas também ganhei minhas tatuagens, uma para cada ano lá dentro.

Foi o que azarou quando voltei para a vida, cada pessoa que se ligava nas tatus virava a cara rapidinho... como se nem tivesse me notado. Só mesmo na nossa bocada todo mundo sabia quem eu era. Ali eu era respeitado. A merda é que, depois dum tempo, a gente começa a querer ser notado por outras pessoas. Tipo, o neguinho percebe que te deve respeito ou paga caro.. E num dia eu e os manos fomos roubar um conversível vermelho... Eu e mais 4 manos....

- Aí, perdeu! Desce do carro e sai vazando ou te arregaçamos de pipoco! vai cuzão, vai!

- Calma! Podem levar o carro, mas não nos machuquem...

- Você vem cá... - Um dos manos me chamou... ele tinha pegado a mulher que tava dentro do carro e a imobilizado com mais dois outros caras. - Ah, que tesuda bichão! Aí, mano! Como você pegou bronca e de tá no maior atraso, você pode ir primeiro! vai que é tua!!

- Beleza, sai logo do caminho e você vai ver o que é... - Quando eu vi... era a orientadora que sempre me ajudou, eu a soltei e ela se foi, ela conseguiu fujir. Ela ia chamar os tiras e tinhamos que fugir.

Mesmo durante a fuga, eu já sabia que era tarde demais para mim. Quem é do crime não pode vacilar nunca. Não pode afinar nem vacilar no momento da ação. Eu vacilei. Deixei que ela escapasse. Só quer era a dona rose, pô. Tipo, o que eu podia fazer? Daí a casa caiu. Porque eu deixei testemunha viva, a polícia fechou dois manos que tavam comigo na noite do roubo. Só não rodei porque fiquei "piano". Passei a viver na surdina sem dar bandeira.

Só que a gangue, o meu povo... todo mundo me botou no gelo. Vacilei com eles e me queimei. Era como se eu nem existisse mais pros manos. Fui totalmente isolado, tão ligados? Parece que o mundo inteiro tinha virado as costas para mim. Comecei a me perguntar que diabos de vida era aquela. De que valeu tudo que fiz pelos manos, se, no final das contas, eu não era ninguém para eles... vocês tem noção? Tantos anos de gangue, e eu nunca tinha machucado ninguem. Não tou dizendo que sou o maior santinho, não não ia machucar gente decente, apenas que o meu esquema era só roubo e furto, que jamais fiquei numa situação daquelas... não era aquela noite. E na hora cabulosa, afinal, vacilei feio.

bastava reparar nas minhas tatus, e quem não me conhecia fingia que nem me viu. Então, de um dia pro outro, até velhos camaradas também viraram a cara pra mim. Algum tempo depois, foi a minha vez de não ver mais ninguém que não me via. Ficou tudo... vazio demais, entendem? E a maior merda é que eu não queria tomar aquele rumo. Mas as coisas eram daquele jeito, pô. Não tive escolha!

Simplesmente, eu... jamais tive escolha, tão ligados?? por isso... vim parar aqui!

FIM DA HISTÓRIA DE MIGUEL...

Todos em seqüência foi contando sua história, até que chegou na vez de David...

- Eu?

- É. Você está aqui, não está? Como você chegou?

- Mas não deveria estar! Eu não faço parte desse lugar

David se levanta com raiva e sai de perto da fogueira e ao mesmo tempo todos avisam para não se afastar muito da fogueira, pois as criaturas matam quem sobem as colinas à noite, que ninguém que foi já voltou.

- O que acha que vai fazer David?

- Eu não sou como eles!

- Eu não disse que era. Mas já que você mencionou...

- Eu não sou. ouviu? Não mesmo!!

David então se lembra novamente da sua esposa, quando eles ainda estavam juntos e em sua cabeça apareceu como um flash back uma cena....

ESPOSA DO DAVID - Como você pode desistir de nós desse jeito, David?
DAVID - Eu não falei que estou desistindo....
- Mas, não tira nem um dia de folga para dedicar à gente, nem tenta....
- O que você espera que eu faça? Que mande todo mundo parar de trabalhar em Los Angeles, só para nós desfrutarmos um fim de semana romântico em Santa Barbara? Olha, eu preciso ir, já estou atrasado a gente conversa mais tarde...
- David, não me dê as costas no meio dessa discussão! Eu sou sua esposa, merda! Como pode fazer isso?
- Como? Sou obrigado, saco... não tenho escolha nenhuma!

- Eu não tinha escolha nenhuma....

- De novo: O que você quer fazer agora?

- Vou subir essa colina para ver o que encontramos no lado oposto.

- Tem certeza? Pode ser arriscado dizem que ninguém retorna. Tanto que eles não saem daqui...

- Eu vou subir!! - David então começou a subir com todas as suas forças aquela colina e ao chegar no topo ele escutou uma voz:

- Olá!! Sorte sua ter conseguido chegar aí! Venha cá, sente aqui com a gente! É perigoso demais à noite, sabia?É melhor correr nenhum risco, não com sei lá o que espreitando nesta região!! Não dá pra saber o que aguarda na próxina colina... É melhor não correr nenhum outro risco! Aqui estamos salvos!!

Foi daí que Laurel e David viu no alto, uma planícies cheio de crateras, cada cratera havia uma fogueira, cada uma com umas 10 pessoas. Elas não saiam de perto da fogueira nunca... Não sabiam nem da existência de uma das outras. Eles tinham medo de continuar e seguir em frente, no medo de saber o que iria acontecer ou o que eles iam achar! David então refletiu pelo resto da noite e no amanhecer de volta a caminhada, Laurel quebra o gelo.

- Quer conversar a respeito?

- Não, eu... preciso refletir um pouco. Além disso, você não entenderia...

- Não tenha tanta certeza.

- Quê?

- Nada! Nem chegou a hora, aliás. Talvez em breve, quem sabe.

- Hora de quê?

- do sangue...