Ato III - Xeque-Mate

por manny em

Não importava se alguém tentasse matá-lo naquele momento, se estivesse em meio a uma corte sendo a acusado de traição ou mesmo seu Protetor estivesse ao seu lado para levá-lo novamente aquele lugar, Meia-Noite degustaria sua refeição como todas as outras, lentamente, saboreando cada pedaço. Alguns mundanos poderiam olhar para os lados procurando de onde viria aquele estranho barulho, mas a mascara escondia a mandíbula de metal.

Estava ali pois se sentia muito cansado das hostilidades vindas das sociedade que participava. A única que lhe tratará com um pouco de respeito tinha lhe convidado para participar de um golpe de estado com os Reis de Gimmie, ele desejava isso, e fora para isso que chegou aquele Feudo Franco, agora estaria frente a frente com o poder máximo da Corte da Aurora e pediria para que ao menos ela o apresentasse para os demais, e pagar o tributo por sua lealdade.

Meia-noite levantou-se e foi andando apressadamente para a cozinha do restaurante, talvez um outro qualquer teria sido impedido pelos empregados presentes, mas não alguém com a benção do Espelho Plúmbeo. Parou assim que viu uma singela porta, de madeira rachada, sem nem ao menos uma identificação como “Apenas pessoal autorizado”, era atrás daquela porta que estava uma Rainha.

Entrou.

Ao entrar Meia-noite pode relembrar porque não falava sempre com Miranda, era uma sala própria para torneios de xadrez, quatro mesas de cada lado e uma grande no centro. Todas com tabuleiros e peças mas os jogadores.... Quatro mesas estavam com esqueletos encostados em suas cadeiras, alguns desmanchados, outros ainda com cartilagem os segurando... Uma mesa estava com um senhor com muita idade, e de aparência sofrida de marasmo, em seu rosto havia tristeza e suas ações eram lentas, demoraria horas para levantar a mão e mover uma peça. Em outra mesa havia uma garota, amordaçada e presa a cadeira, ela chorava muito e Meia-noite podia sentir seu desespero, e sua clemencia.

Uma bela mulher caucasiana que parecia ser mais baixa do que realmente era estava no meio da sala, possuía vestes simplórias e brancas e um cabelo avermelhado, encaracolado e mal cuidado, e alguns traços peculiares, um batom escuro nos lábios, uma sobrancelha grossa , um olhar vivo e inquietante e um andar meio... Angustiante, como se fosse na pontas dos pés, como uma bailarina. Além de uma feição assustadoramente feliz. Essa era a mascarilha de Miranda Carmesim, a autoridade máxima da Corte da Aurora.

-Olha só, um fiel de minha corte veio me ver – Miranda disse, sem mesmo se virar para Meia-noite, em seguida ela foi andando na ponta dos pés, em passos curtos com os braços um pouco levantados até a grande mesa de xadrez no centro da sala – Por que veio me procurar plebeu?

- Minha Rainha – Meia-noite faz uma mensura – vim aqui lhe pagar meu tributo por sua generosidade em me aceitar em sua corte

Meia-noite vai até a mesa de centro, sentasse cuidadosamente – evitando movimentos bruscos – e segura um peão e o move delicadamente, deixado a peça com alguém que pertencia a ele: um resquício de sonho, com gosto de óleo e frio. Miranda fecha os olhos, e o destino se encarrega de guiar aquele pequenino sonho até ela – e por um momento Meia-noite pode ver, os belos cabelos de sua Rainha ficarem brancos, sua pele ainda mais pálida, suas vestes estarem mais lindas, ela transbordava presença e glamour.

- Xeque-Mate – Miranda disse, ele nunca entendeu como ela ganhava tão facilmente – Olha só, você finalmente jogou! - ela se levanta e sai andado daquela maneira peculiar até a mesa com um esqueleto aos pedaços, e faz um movimento com a Torre, ficaria ali fintando o tabuleiro por muito tempo, mas a movimentação da garota presa e amordaçada ao lado a chamaram a atenção.

-Vim também por outro motivo minha Rainha, gostaria que marcasse um baile para minha apresentação formal na corte - disse Meia-Noite um pouco tímido 

-Não, não, não! Não é assim que se joga – Miranda disse a garota presa, ignorando completamente seu súdito – eu já disse, vou explicar as regras mais uma vez, se não jogar certo vou escrever as regras em você para não esquecer, como naquele alí – Meia-noite pode observar que ela apontava para outro monte de ossos num canto, e pode perceber que estava escrito coisas nos ossos - Meu fiel, treine-a para vossa Rainha, tens uma semana para entregá-la com o conhecimentos dos movimentos e das regras do jogo de xadrez.

-Sinto muito minha Rainha mas não--

-NÃO GOSTO DE SER CONTRARIADA!

rainha_branca

Meia-noite estremeceu, os gritos de sua rainha que o interromperam ajudavam mas aquela sala... A luz da lampada havia diminuído, e agora a pouca Claridade que tinha no local deixava com que existisse mais sombras, elas pareciam mais turvas, algumas vezes pareciam se mover as tabuas de madeira no chão rangiam tão algo quando Miranda se movia para outro tabuleiro que quase cantavam, ou gritavam de dor por serem pisados, ela mesmo estava mais próxima do que realmente era, uma linda mulher vestida de branco e em sua cabeça uma coroa que brilhava como o sol. Meia-noite só percebeu que algo esta muito errado quando viu não apenas um, mas vários esqueletos levantarem-se e moverem uma peça do tabuleiro em que estavam. Pensou em sair dali, mas Miranda o viu, fez uma mensura e disse:

-Olha só, um fiel súdito veio me visitar! Diga-me Fiel o que deseja de sua Rainha?

- Eu vim pagar... – ele gaguejava, e começou a tremer quando observou o o chão desfazendo-se e criando um abismo entre ele e a porta, só havia um único caminho para seguir, onde Miranda estava – Eu vim pagar meu tributo...

- Pois bem – e com um gesto da Rainha, tabuleiros, mesas, peças e tudo mais foram voando e se encaixando entre ambos, Meia-noite pode ver as sombras se juntando logo atrás de Miranda, as sombras saiam das paredes, avançavam sobre ele na forma de uma boca cheia de dentes, mas ele não fora devorado, a boca de sombras estava sobre ele, ainda aberta, babando algo preto como o piche, e mesmo ofegante e tremendo, ele foi até o tabuleiro pagar seu tributo.

Desta vez Meia-noite mal conseguiu ouvir o “Xeque-mate”, e nem se importava mais com isso, Ela se levantou e sai andando como uma bailarina, o chão voltara ao normal e as sombras, mesmo que monstruosas voltaram as paredes, e ele observou Miranda dedilhar até um outro tabuleiro, mas – aparentemente- não havia nenhum jogador.

- Tens algo mais a me pedir, meu fiel súdito?

- Não minha---

- MENTIRA! - gritou Miranda novamente, e tudo ficou escuro, em meio a trevas Meia-noite pode ouvir gritos de súplicas, dor, pode sentir a angustia, a fome, a sede que aquele lugar emanava de seus antigos jogadores – Fale logo o que veio fazer aqui!

- Se eu trazer um novo jogador para ti, minha Rainha, você promoverá um baile para me apresentar formalmente? - disse Meia-noite tomando seu ultimo vestígio de vontade de continuar aquela conversa – e se fosse alguém da Corte da Desgraça? - o rosto de Miranda apareceu na sua frente, em meio as trevas, não de uma luz externa, ela mesmo brilhava, por isso podia vela em meio a escuridão, ela estava com uma feição muito mais perturbadora.

- Eu juro, por Meu Nome, por Minha Corte, por Carmesim – os cabelos negros dela davam lugar aos brancos - Se trazer alguém há mim, uma baile formal eu darei a você, fiel – ela falava num tom ameaçador, já era possível ver seu lindo vestido branco de cetim iluminando ainda mais o local – Mas, se conseguir me dar, de bom grado, um jogador da Corte da Lâmina Fria, deixarás a plebe e ganharás minha Senescalia – em a sua volta ficava cada vez mais claro, sua pele cada vez mais branca, seus lábios e olhos cada vez mais negros, Meia-noite já podia ver a sala novamente – Se falhar, muito mais do que a falta de baile você terá do que reclamar.

Meia-noite aceitou sem pestanejar, com sorriso bobo na cara. Rainha do Amanhecer esquecera de dar um prazo. Xeque-mate, uma brecha excelente que poderia ser usada em um momento com mais tempo. Ele fez uma mensura e se despediu, ao sair de lá viu em um relógio que passou seis horas desde que tinha entrado no restaurante para almoçar. Seis horas naquele vão da cozinha do restaurante.

Mas agora Meia-noite não teria tempo para se preocupar com a tarde perdida, ou com seu possível Senescalia na corte, ele teria que procurar onde fica a residencia de um Perdido conhecido como Morbus para roubar um livro que Ravena havia lhe pedido, e a única pessoa que ele sabia que poderia lhe responder essa pergunta – sem se preocupar com sua sanidade - era Branca Spinosa, aquela que possuía o cargo que ele roubaria um dia qualquer...