Crônica - Outbreak - parte 03
Raccon City, 28 de setembro de 1998, 02:55 AM.
Gregory nos entregou as chaves do shopping e disse que ficaria ali nos monitorando pelas câmeras até que achássemos uma saída. Confusa com tudo o que estava acontecendo, por um momento eu me desliguei da realidade e fui vagando juntamente com o grupo, até que a realidade me chamou de volta à tona fazendo eu me lembrar do Rico. Será que ele teria conseguido escapar daquela explosão? Minhas esperanças começaram a diminuir a cada segundo que eu passava sem respostas.
Para evitar os elevadores, fomos ao quarto andar através de uma das lojas de eletrodomésticos do local, utilizando as chaves de Gregory. Todo o silêncio que se fazia no quarto andar mostrava que ali era um local seguro, contudo, mesmo assim eu não me sentia segura com a situação e, olhando para os outros eu pude perceber nitidamente pela expressão de cada um que eles sentiam o mesmo.
Algumas lojas neste andar nos foram úteis, portanto, tivemos que saqueá-las. George a principio não gostou da idéia de se tornar um ladrão, mas mudou rapidamente de idéia quando entramos na loja de camping e ele viu um arco grande com uma aljava cheia de flechas. Yoko o acompanhou pegando outro arco que estava ao lado, na vitrine da loja. George era um exímio arqueiro. Eu já havia presenciado algumas de suas competições com o arco as olimpíadas
Universitárias. Pelo jeito que eu vi Yoko manejar o arco, pude concluir que a mesma também fazia parte da equipe, fazendo disso mais uma ligação entre o médico renomado e a aluna promissora. David pegou o terceiro arco, mesmo após algumas queixas de pessoas que ainda estavam desarmadas, afinal, ele já tinha a arma que eu encontrei e dei pra ele. Comecei a sentir um forte grau de egoísmo da parte dele. Egoísmo esse que pode vir a prejudicar o grupo futuramente. Pegamos também várias facas nesta loja, bem como algumas cordas e equipamentos de rapel, botas impermeáveis e uma pistola sinalizadora, bem como várias outras coisas que conseguimos guardar nas mochilas também subtraídas do local.
Neste andar, outras duas lojas nos interessaram. A farmácia, onde Kevin trocou os curativos e todos se abasteceram com remédios em geral e a loja de doces, onde pegamos algumas barras de cereal por precaução. Nesta loja, nos sentamos e conversamos, fazendo enfim as devidas apresentações. O vigia Wilkins se apresentou a mim e disse que preferia ser chamado de Mark. A estudante de traços orientais se apresentou como Yoko Suzuki e disse estagiar na clínica de George. Por último, O garoto de cabelos amarelos se apresentou com o nome Jim Chapman, dizendo ser funcionário da companhia de metrô da cidade. Por ali ficamos por alguns minutos, conversando sobre tudo que estava acontecendo e tentando traçar uma estratégia para sair dali.
Vendo que o terceiro andar era inviável, decidimos voltar pelas escadas de incêndio e passar pelo segundo andar. Voltamos à sala das câmeras para buscar Gregory e dar mais uma olhada nos dois primeiros andares. Gregory estava com uma aparência bem pior desta vez, suado e aparentemente muito frágil. Olhando os dois primeiros andares, contamos quinze dessas criaturas perambulando pelo primeiro e segundo andar, bem como pelo estacionamento externo do shopping. No segundo andar, onde um enorme depósito dividia espaço com a garagem “G2”, um caminhão de uma empresa de fretes estava com sua traseira batida na porta do depósito. Olhando as criaturas que perambulavam pelo local, percebemos que dois deles estavam vestidos com as roupas da empresa.
Parecia obvio que a única saída para nós era entrar no caminhão e dirigir pela cidade até onde conseguíssemos chegar. Com este plano pré-estabelecido fomos em frente, passando novamente pelo terraço e descendo as escadas de incêndio até o segundo andar. Dessa vez, as escadas já não estavam tão firmes devido à horda de criaturas que tentava derrubá-las. Agora parecia o dobro de criatura que havíamos enxergado antes.
Novamente no corredor, enquanto nos aproximávamos da outra porta, eu percebi que Kevin sentiu alguma coisa como uma “pontada” na região onde havia sido arranhado. Ele não disse nada, eu olhei para ele e perguntei se estava tudo bem e recebi um “sim” um tanto quanto indeciso.
David tentou por alguns instantes inutilmente abrir o cadeado com suas ferramentas. Sem paciência, Mark tentou arrombar a porta com a força de seus pés, piorando a situação, uma vez que o barulho produzido atraiu algumas das criaturas que ali estavam. Percebendo que arrombar a porta seria inútil, David usou suas ferramentas para abrir a grande porta retirando suas dobradiças. Ao tirar as duas dobradiças superiores, a porta foi empurrada contra nós e caiu sobre Kevin que foi ao chão, aquelas criaturas em cima dele.
Um show incrível de boa pontaria por parte de George e Yoko salvou a vida de Kevin que estava prestes a ser atacado por quatro deles. David também arriscou alguns disparos, porém, não foi feliz em nenhuma de suas tentativas. Ele ainda precisava de um pouco mais de treino.
Enquanto George, Yoko e David recuperavam algumas das flechas que haviam disparado, nós fomos em direção ao caminhão que estava com as duas portas abertas. Mark deu um soco no painel do caminhão e desanimado falou que as chaves não estavam lá. Tínhamos duas alternativas agora, a primeira era fazer uma ligação direta, que foi descartada após Mark dizer que não permitiria que alguém pudesse estragar o único meio de fuga tentando algo que nunca fez na vida. A segunda alternativa foi a que eu mais temia, mais ainda por saber que ela seria adotada pelo grupo. Teríamos que ir até o primeiro andar e pegar a chave que provavelmente está com um dos funcionários uniformizados da empresa do caminhão. Assim fizemos, todos os que estavam armados foram à frente, inclusive o Gregory que estava bastante debilitado. Kevin acertou um tiro certeiro na fronte de um deles que estava subindo pela rampa que estávamos descendo. George e Yoko ficaram perto de nós, fazendo nossa proteção, enquanto Mark, David, Kevin e George foram com suas armas em punho no encalço dos outros dez que ainda estavam ali.
Gregory abateu um dos que estavam uniformizados e correu, mesmo com dificuldade em sua direção para revistá-lo. Quando se abaixou sobre ele, em um momento de desatenção outro deles saiu de trás do posto de gasolina que dividia espaço com este estacionamento e cravou seus dentes no pescoço dele. Kevin acertou um tiro no homem, tirando-o de cima de Gregory. Neste momento eu corri em direção a ele e, sabendo que ele morreria em breve, peguei seu revólver e munições. Eu não sabia atirar, porém, a arma dele agora seria mais útil comigo. Mark veio em auxilio ao Gregory, acompanhado por Cindy que ministrou ali os primeiros socorros nos mesmo levando-o para a rampa onde estávamos anteriormente. Ela se sentou no chão e deitou-o em seu colo enquanto os outros batalhavam por nossas vidas. Mark ficou próximo por alguns segundos.
Lentamente os outros prosseguiram e foram exterminando um a um. Eu olhava fixamente para Gregory quando ouvi Kevin gritando meu nome. Me virei assustada na direção onde estava aquele que acabara de ser abatido por Kevin. Ele simplesmente se levantou novamente após levar um tiro próximo ao coração. Ele não parecia sentir dor alguma e caminhava lentamente em minha direção com os braços estendidos para mim. Com as mãos trêmulas eu apontei a arma em sua direção, o medo não me deixou mirar ou sequer olhar para onde e estava atirando. Com os olhos fechados eu puxei o gatilho, ouvi um tiro, acompanhado por um segundo disparo e quando abri meus olhos, eu o vi caído, mas não por minha causa e sim por mais um tiro do Kevin que novamente salvou minha vida.
Lentamente, os outros foram avançando pela garagem e abatendo um a um, enquanto eu refletia sobre o recente acontecimento. Meus pensamentos foram interrompidos pela voz de Cindy dizendo conversando com Gregory, que havia se mexido, tentando se levantar indo em direção a ela. Cindy fechou os olhos dele e disse para ele descansar, ele pegou as mãos dela e levou em direção à sua boca. Cheirou a delicada mão da garçonete por alguns instantes e para espanto de todos, mordeu sua mão. O grito agudo da garota foi desviou a atenção de todos por alguns instantes. Mark correu em sua direção, chutou Gregory e deu um tiro à queima roupa explodindo a cabeça dele.
A mordida foi profunda, Yoko veio em seu auxílio e demorou alguns minutos para estancar o sangramento, enquanto David e George liquidavam os últimos dois e pegavam as chaves do caminhão.
Kevin foi até eles, no estacionamento externo e ficou paralisado por alguns instantes, chamando a todos nós quando voltou a si. O lado externo do shopping estava totalmente cercado por uma verdadeira horda deles, todos batendo no portão, com a mesma violência. Nosso plano de fugir com o caminhão estava arruinado, não conseguiríamos ir longe, mesmo passando por cima deles. Eram muitos.
Jim nos indicou uma tampa de esgoto que estava ali, próximo a um dos portões de acesso à rua, falando que se conseguíssemos chegar à estação de metrô estaríamos mais perto do nosso objetivo.
Após um pouco de discussão, todos aceitaram ir através do escuro esgoto. Iluminados pelas lanternas subtraídas da loja de camping, nós vagamos em direção ao norte, sem uma idéia certa de onde pudéssemos estar indo. Pouco mais de dez mais tarde, terminamos o caminho onde um corredor se fechava em uma escada que subia uns quatro metros em direção à rua.
David subiu as escadas e levantou vagarosamente a tampa do esgoto a fim de avaliar a situação da rua e viu uma pequena rua com cerca de vinte deles espalhados. À sua frente, o Departamento de Polícia da cidade. Ele desceu e nos contou o que pareceu uma boa notícia, afinal, deve haver armas e munições lá dentro, sem contar que podemos encontrar pessoas que possam nos ajudar.
Saímos correndo um a um em direção à delegacia. A porta trancada foi arrombada com um tiro desferido por David que entrou primeiro e deu suporte aos outros.
Mark foi o último a passar, fechando a pesada porta e prendendo-a com seu corpo até que os outros empurrassem um pesado armário para bloquear a entrada do local.